sábado, 12 de maio de 2012

Coletivismo e ambientalismo


Em Mein Kampf, Hitler diz com todas as letras que o indivíduo (no caso, se me lembro bem do contexto, o soldado ariano) deve se sacrificar por sua raça. Assim, o nazismo é uma espécie do gênero "coletivismo", conjunto de doutrinas segundo as quais a coletividade precede a individualidade. Aliás, note-se bem que, neste ponto, a extrema direita toca a extrema esquerda: são variações de um gênero comum. Assim também o princípio do ambientalismo - quando ele faz algum sentido e não se reduz a uma adoração hippie da natureza - é o sacrifício do bem-estar individual em nome da preservação da espécie.

Por um lado, o ambientalista parece ter anseios primitivistas, desejando uma sociedade sem carros, onde o consumo privilegie os produtores locais e por aí vai. Por outro lado, paradoxalmente, ele parece um fanático cientificista, que se agarrou com unhas e dentes à teoria segundo a qual o progresso da nossa civilização gerou o aquecimento global, que, por sua vez, destruirá nossa espécie em 20 anos ou algo assim.

De minha parte, como eu não sou meteorologista nem nada, não vou debater teses científicas. Porém, sabendo da falibilidade intrínseca às predições da ciência em geral, bem como do baixo índice de acerto daquele ramo da ciência em particular, tenho cá minhas dúvidas sobre haver razão para tanto alarmismo, ainda mais com tantos interesses políticos envolvidos. Ademais, ainda que fosse certo concluirmos que, a seguirmos como vamos, acabaremos com o mundo em poucas décadas, essa ainda pareceria ser uma predição fadada ao fracasso dado o simples fato de que, por decisão política ou não, não continuaremos mesmo da mesma forma. O progresso tecnológico das últimas décadas nos mostrou que nem sequer temos como saber exatamente que tipo de tecnologia teremos em 20 ou 30 anos, portanto, que tipo de vida estaremos vivendo.

Considerações técnicas à parte, de todo modo, o meu ponto diz respeito à correção moral dessa cobrança para que abramos mão dos confortos que a técnica moderna tornou-se capaz de nos oferecer em nome de indivíduos inexistentes: as futuras gerações. De que vale que ainda haja espécie se, para sua preservação, cada indivíduo tiver que sacrificar boa parte do prazer de viver que teria condições de proporcionar para si? De que vale, afinal, a preservação de uma espécie por si mesma? E daí se a própria humanidade deixar de existir um dia? Na verdade, mais cedo ou mais tarde, a extinção de toda espécie é inevitável no eterno devir que a tudo devora. Eu, particularmente, nem desconfio do porquê de um indivíduo ter que adotar uma perpetuação imaginada de sua espécie como seu próprio fim. O que existe, afinal, são indivíduos que podem ou não ser felizes aqui e agora. Sendo assim, que cada um busque sua felicidade sem interferir com a mesma busca por parte de outro indivíduo existente. Toda demanda moral que vai além dessa exigência parece-me filosofia vã ou política mal intencionada.

4 comentários:

  1. Santo Deus! Pelo menos a Senhora não postou esse texto hoje, o dia das mães...

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    1. Bem lembrado. Por falar em filhos, quem defende a legalização do aborto, por exemplo, não tem o direito de se escandalizar com meu post, afinal, se o aborto não se constitui como crime, é justamente porque não há deveres para com seres que ainda não se constituem como sujeitos, ou seja, não há deveres para com futuras gerações.

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  2. Pode-se alegar que um não cuidado com a natureza leva a uma interferência na busca por felicidade de terceiros, não? O excesso de poluição em grandes centros compromete a qualidade de vida de variadas formas, não me parecendo ser possível estar à mercê deste processo. Poderíamos aumentar a lista, mas não vem ao caso. Talvez o problemático é que a tua proposta de elevar o indivíduo sobre a espécie (o que me pego fazendo toda vez que calunio o Estado ou os discursos politicamente corretos repetidos como mantras por pessoas "bem intencionadas) contraria a ideia final do post acerca do direito à felicidade sem interferências de outrem.

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  3. Nesta hipótese sobre os limites do arbítrio de um serem dados pela liberdade do outro, há sempre dois riscos, Marco: o primeiro é a confusão de liberdade com qualidade de vida; o segundo é a confusão entre uma obstrução direta da ação do outro com a longa e complexa cadeia causal na qual a minha ação em particular não poderia ser diretamente determinada como a causa de uma obstrução à liberdade do outro.

    No primeiro caso, por exemplo, vc constrói um muro alto que bloqueia o sol para a horta do seu vizinho. Com isso, vc diminui a qualidade de vida do seu vizinho, mas não tira a liberdade dele por isso. Meus vizinhos, por exemplo, tiraram a vista linda q eu tinha do pôr-do-sol, o q me tirou um grande prazer. Mas eu não tinha direito a essa vista. Ela era parte da minha qualidade de vida, mas não uma propriedade minha. E eu não fui impedida de olhar naquela direção, do mesmo jeito q o sujeito da horta não foi impedido de plantar sua horta. Essas ações apenas deixaram de ser algo vantajoso para nós.

    No segundo caso, uma coisa é eu te prender em uma garagem e despejar gás carbônico lá dentro, ou contaminar a água da sua casa com resíduos químicos da minha indústria. Isso são ações minhas sendo causas diretas de danos ao seu corpo, q é sua maior propriedade. Agora, o quanto a emissão de CO2 do meu carro contribui para q alguém tenha câncer de pulmão na cidade vizinha? Isso não é mensurável ou determinável. Legislar com base nesse tipo de cadeia de causa e efeito, com causas complexas e intermediárias a perder de vista, retirando minha liberdade de usar um carro, por exemplo, é mergulhar o mundo em uma tirania, onde não faz diferença q ainda exista humanidade mesmo.

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