quarta-feira, 2 de maio de 2012
O conhecimento e o mercado
Outro dia, eu queria ler um artigo online, mas eis que me cobravam mais de USD30,00 pelo acesso a ele, o que me fez desistir. A bem da verdade, isso me acontece toda hora. Pensei que apenas gente como eu sofria desses males, afinal, sou pobre, pão-dura e, ainda por cima, trabalho na periferia do mundo acadêmico, o que ocasiona que minha instituição também não tenha recursos para garantir meu acesso à toda bibliografia que preciso para o meu trabalho. Mas eis que, hoje, vejo este artigo sobre a bronca de Harvard com os altos preços praticados pelas editoras dos periódicos. Ora, se está ruim até para Harvard, imagina para mim!
Naturalmente, como sou uma defensora do livre mercado no sentido estrito da expressão, não condeno moralmente um autor que vise o lucro com sua obra. Porém, se o objeto da sua obra é o conhecimento, não posso deixar de notar que a transformação da obra em artigo de luxo é um tiro no próprio pé, afinal, o conhecimento pressupõe a publicidade, justamente porque o seu desenvolvimento está atrelado à crítica por seus pares. Assim, se você se torna famoso e vende caro o acesso à sua obra científica, você restringe de tal maneira o público que terá acesso a ela que você pode deixar de receber exatamente a análise crítica que mais lhe interessaria. Portanto, não por generosidade, mas por interesse na evolução do próprio trabalho, quer me parecer que o acadêmico teria boas razões para publicar a sua obra da forma mais acessível que lhe fosse possível.
Ademais, quando se trata de um pesquisador que, por ventura, tenha tido sua pesquisa financiada com recursos públicos, aí, sim, não me parece moralmente aceitável que seja cobrado do público o acesso ao resultado da pesquisa. Isso se aplica, sobretudo, ao Brasil, onde mesmo os pesquisadores vinculados a universidades privadas gozam do fomento das agências públicas. Já é suficientemente grave que todo o público pague o salário de professores que educarão apenas a uma pequena parcela privilegiada da população. Qualquer nível de decência mínima é extrapolado quando o público não pode sequer ler o resultado das pesquisas que a universidade pública produz ou que agências públicas financiam.
É claro, no entanto, que o que restringe o acesso ao resultado das pesquisas, via de regra, nem sequer é o desejo de lucro do pesquisador. Eu mesma, por exemplo, jamais fui paga por uma publicação. O problema é a pressão que sofremos para que nossas pesquisas apareçam em revistas devidamente qualificadas, nem sempre disponíveis a todos, e não em quaisquer sites da internet.
Em parte, é verdade, essa pressão é benéfica, porque as revistas qualificadas submetem nossos trabalhos a pareceristas que prestam valiosas contribuições. Francamente, o simples fato de você saber que seu trabalho será submetido a um parecerista capacitado (mais de um, na verdade) já aumenta muito o seu empenho e rigor na produção do texto (não é como escrever este blog, por exemplo).
Todavia, podem existir outras maneiras de avaliarmos o mérito de um trabalho e incentivarmos o empenho em sua produção, sem que tenhamos que levar em consideração o veículo em que o trabalho foi divulgado. Penso que a candidata óbvia à substituição seja justamente a análise da repercussão do seu trabalho no trabalho dos seus pares. Por exemplo, cada universidade manteria um site para divulgar a pesquisa do seu corpo docente e dicente. O mérito seria atribuído àqueles trabalhos que fossem linkados o maior número de vezes nos sites das demais universidades. Fica aí a ideia ;-)
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