Eu não dormi bem de sexta para sábado e nem de sábado para domingo. Passei ambas as noites na estrada. Viajei a trabalho, mas com recursos próprios e sem receber nada para isso. Também não trouxe nenhum certificado comigo. Mas, tudo bem, viajei porque quis afinal. E por que eu quis? Porque viajei para encontrar meu "Professor" e gozar da oportunidade de discutir filosofia com ele por algumas horas. Por sinal, ele também não recebeu dinheiro ou certificado algum por essas horas.
É sempre assim que eu o chamo, "Professor", ainda que, depois de mais de dez anos, eu tenha mais intimidade com ele do que muitos que o tratam pelo primeiro nome. "Para que tanta formalidade?", certa vez, me perguntou um amigo que me ouviu ao telefone com ele. Mas não é formalidade. É só respeito por quem, de fato, é e sempre será meu "Professor".
Nem sempre foi assim, porém. Meu "Professor" tem a mesma consideração por parte de muitos. Parece-me que de todos que são ou já foram seus alunos. Não é raro que a conversa do boteco gire em torno da admiração que todos compartilham por ele. Com isso, eu, que sempre tive tendências subversivas, sempre fui avessa à autoridade, primeiro, interpretei essa admiração, vista de longe e de fora, como bajulação, coisa tão freqüente na academia.
Quando eu imaginaria que alguém tão estimado tanto me estimaria justamente por desafiá-lo? "Eu não gosto de pusilânimes!", há muito tempo, ele disse para me tranqüilizar. Desde então, foi o que ele me provou a cada dia de convivência. O "Professor" fundou sua própria "escola", como atesta o título de um artigo do número atual da Studia Kantiana. Entretanto, sua maior obra não é a doutrina dessa escola, explicada em dezenas de publicações, mas sim um modo de filosofar, com paixão e liberdade, afeto e rigor, que ele inspirou em cada um de nós.
Assim, neste dia dos professores, fica minha homenagem a um professor, a este meu "Professor", bem como a todos aqueles que verdadeiramente amam aprender e se dedicam ao conhecimento, seja lá qual for a profissão que exerçam para viver. Apenas não receberão minhas felicitações aqueles que, apenas por terem sido contratados para um determinado cargo, muitas vezes mal e porcamente ocupado, se acham merecedores da mais alta estima e deferência. Eu, de minha parte, estimo indivíduos excelentes, e não categorias por si só.
segunda-feira, 15 de outubro de 2012
sexta-feira, 5 de outubro de 2012
Sobre as coisas que fazemos melhor juntos
No primeiro debate entre os presidenciáveis americanos, apesar do tom moderado de Romney, foi razoavelmente seguido o script segundo o qual se espera que um republicano defenda um Estado menor, com mais ênfase no livre mercado, enquanto um democrata defenda a atribuição de um papel muito mais substancial para o Estado na resolução de problemas. Por exemplo, enquanto Romney afirmou que a competição é que diminui os custos de um produto ou serviço, Obama expôs seus temores de que, sem intervenção estatal, grande parte da população não consiga ter acesso à saúde.
Como todos já sabem a esta altura, Obama teve um desempenho bastante fraco, tendo sido acuado pelo republicano. Não houve nada de novo ou surpreendente no discurso democrata, nenhum momento de brilho. Porém, uma passagem despertou minha atenção exatamente por ser um lugar comum coletivista. Lá pelas tantas, Obama, como costuma fazer até o mais radical dos comunistas, defendeu a liberdade como um princípio político fundamental. Mas, então, como também é regra em todos os 50 tons de vermelho, ele inseriu um "but". É esse "but", meus amigos, que separa individualistas, como eu, de coletivistas, como Obama. Após esse "but", ele disse que há coisas que fazemos melhor juntos. Para completar, ele afirmou que tal reconhecimento não implica em uma restrição da liberdade, mas na sua ampliação. Agora, vejamos por que isso é uma grande mentira coletivista armada para que não precisem se assumir como inimigos da liberdade, que é o que verdadeiramente são.
Em primeiro lugar, é claro que há coisas que fazemos melhor juntos. Isso é uma trivialidade. De uma simples folha de papel a um iPad, quantos não tiveram que unir seus esforços para que o produto final surgisse? Estranho seria se alguém dissesse que há coisas que podemos fazer melhor sozinhos. Nessas coisas é que seria mais difícil pensar. Ora, mas o individualista não diz justamente isso? Não!
O individualista, em oposição ao coletivista, não é aquele contrário à cooperação social. É apenas aquele que acredita que o indivíduo não pode ser coagido a cooperar. Quando um iPad fica pronto, por menos que tenha recebido um operário chinês, cuja mão-de-obra é facilmente substituível, e por mais que tenha recebido o talvez insubstituível Jonathan Ive, todos trabalharam voluntariamente no projeto por julgarem ser do seu melhor interesse trabalhar em vez de não trabalhar. Ive calculou que o trabalho compensaria mais do que uma aposentadoria milionária na sua Inglaterra, o chinês anônimo calculou que o trabalho compensaria mais do que a lida no campo. O livre mercado, portanto, não é igualitarista, mas é uma forma livre de cooperação social. Por ele, nem todos obtêm as mesmas vantagens materiais, mas ninguém tem sua liberdade restrita, se entendermos por liberdade a capacidade de agir segundo seus próprios cálculos de custo e benefício, sem coerção externa.
Mas e o modelo de Obama, que é o modelo estatal de cooperação social? A trivialidade que Obama disse camufla uma verdade na qual, talvez, ele nem sequer tenha pensado. O que ele disse, inserido no devido contexto, significa mais do que afirmar simplesmente que, juntos, podemos fazer melhor. Ao defender que o Estado seja o mandante da ação conjunta, o que Obama defende implica que um indivíduo que julgue não ser beneficiado pela cooperação pode ser coagido pelos demais a cooperar.
Agora, por favor, compare os dois cenários. O operário chinês vive em condições materiais desfavoráveis. Porém, ele se perfilou na porta da FoxConn candidatando-se a um posto de trabalho. Por tudo que sabemos, ele não foi capturado na zona rural e levado à força para o perímetro urbano, para ser submetido a trabalho escravo. Até onde sabemos, inclusive, ele pode deixar o emprego se assim o desejar. Assim, a condição material do chinês pode estar em contradição com o ideal de vida do meu leitor, mas você não fará nenhum sentido se afirmar que o chinês não é livre. A menos, é claro, que estejamos falando de coisas diferentes quando usamos a palavra "liberdade". E quanto ao cenário estatal de cooperação social?
Muito bem, novamente, de acordo com o seu ideal de vida, pode ser indesejável que alguém não tenha acesso à saúde. Porém, você não pode dizer que não teve sua liberdade restrita aquele que foi forçado a contribuir para que o Estado pudesse facilitar o acesso de outros à saúde. Se uma mera pracinha é construída com dinheiro público, ela é construída com recursos obtidos via coerção, e não por doações espontâneas. Assim, você pode gostar mais do seu bairro com a pracinha, pode até mesmo afirmar que você não poderia ter construído a pracinha sozinho e nem teria como convencer seus vizinhos a construí-la com você. Mas você não pode dizer que ela seja fruto de livre cooperação, a menos que todos os contribuintes, sem exceção, tenham concordado ou, diretamente, com a construção da pracinha ou, indiretamente, com qualquer que fosse o uso daqueles recursos que envolviam sua contribuição.
Por exemplo, alguém pode fazer uma doação para uma associação de bairro e concordar que o recurso seja utilizado em uma melhoria qualquer para o bairro, conforme o resultado de uma votação. Nosso contribuinte, particularmente, preferiria uma rampa para prática de skate, mas sua liberdade foi respeitada com a construção da pracinha, uma vez que ele aceitou fazer a contribuição, bem como concordou com o procedimento de decisão sobre o destino de sua contribuição. Simplesmente, não é esse o modelo estatal.
No modelo estatal, o indivíduo é forçado a contribuir e a acatar o modelo de decisão, que, na melhor das hipóteses, lhe dará direito a um voto, que bem pode ser o voto vencido. É por essa razão que a cooperação social restringe, e não amplia a liberdade individual, quando é levada a cabo por meio do Estado, e não por via do mercado ou de associações privadas. A grande diferença entre o mercado ou associações privadas e o Estado é que, no mercado ou nessas associações, cada indivíduo precisa estar convencido de que tem mais a ganhar do que a perder ao tomar parte em qualquer iniciativa conjunta. Quando há interferência estatal, por outro lado, embora seja bem possível que o indivíduo ainda tenha muito mais a ganhar do que a perder com a cooperação, ele não precisa estar convencido disso. É esse o ponto que coloca o Estado em conflito com a liberdade individual sempre que ele se incumbe de tarefas construtivas como as que os democratas, por exemplo, têm em vista.
Neste ponto, você pode perguntar: "um mundo mais igual, do ponto de vista material, não seria preferível a um mundo livre?" Talvez, sua resposta seja "sim". Você pode ser do tipo que realmente sobrepõe a igualdade à liberdade, enquanto meu ponto com este post é, sobretudo, argumentar que Obama estava errado em sua colocação, isto é, mostrar que iniciativas estatais restringem, sim, a liberdade, portanto, ele deveria assumir que suas políticas violentam a liberdade individual. Isso signifca que, ainda que eu esteja certa, você poderia, perfeitamente, preferir um mundo em que o Estado tome decisões pelos indivíduos em nome do próprio bem de cada um. O único problema com essa decisão é que, via de regra, você só será coerente com ela, quando, acidentalmente, a imposição estatal coincidir com o que você quer ver realizado, ou, em outras palavras, quando forem os outros os efetivamente coagidos. Afinal, qual o sentido de alguém, espontaneamente, querer ser coagido a fazer o que não quer ou deixar de fazer o que quer? O que você quer é que os outros sejam coagidos a cooperar com seu ideal de mundo, de vida.
Imagine, por exemplo, que você queira melhorar a situação daquele operário chinês citado acima ou ajudar seu concidadão a ter acesso à saúde. O mercado não lhe proibe de fazer nada disso! Você pode transferir metade do seu salário para a conta de um operário na China, bem como pode deixar de beber cerveja para doar o dinheiro a um idoso pobre que precise de medicamentos. Ok, louvável da sua parte! Ser um estatista, como Obama, porém, é ir muito além disso. É querer que todos os demais sejam coagidos a entregar, por exemplo, o valor equivalente ao de uma cerveja para que o Estado possa comprar medicamentos para quem precisar. Bela compaixão, diria (e disse) Romney! No fim, é claro, o Estado acaba tirando o dinheiro do seu remédio para que algum político tome cerveja com ele. Mas isso já é outra história...
Como todos já sabem a esta altura, Obama teve um desempenho bastante fraco, tendo sido acuado pelo republicano. Não houve nada de novo ou surpreendente no discurso democrata, nenhum momento de brilho. Porém, uma passagem despertou minha atenção exatamente por ser um lugar comum coletivista. Lá pelas tantas, Obama, como costuma fazer até o mais radical dos comunistas, defendeu a liberdade como um princípio político fundamental. Mas, então, como também é regra em todos os 50 tons de vermelho, ele inseriu um "but". É esse "but", meus amigos, que separa individualistas, como eu, de coletivistas, como Obama. Após esse "but", ele disse que há coisas que fazemos melhor juntos. Para completar, ele afirmou que tal reconhecimento não implica em uma restrição da liberdade, mas na sua ampliação. Agora, vejamos por que isso é uma grande mentira coletivista armada para que não precisem se assumir como inimigos da liberdade, que é o que verdadeiramente são.
Em primeiro lugar, é claro que há coisas que fazemos melhor juntos. Isso é uma trivialidade. De uma simples folha de papel a um iPad, quantos não tiveram que unir seus esforços para que o produto final surgisse? Estranho seria se alguém dissesse que há coisas que podemos fazer melhor sozinhos. Nessas coisas é que seria mais difícil pensar. Ora, mas o individualista não diz justamente isso? Não!
O individualista, em oposição ao coletivista, não é aquele contrário à cooperação social. É apenas aquele que acredita que o indivíduo não pode ser coagido a cooperar. Quando um iPad fica pronto, por menos que tenha recebido um operário chinês, cuja mão-de-obra é facilmente substituível, e por mais que tenha recebido o talvez insubstituível Jonathan Ive, todos trabalharam voluntariamente no projeto por julgarem ser do seu melhor interesse trabalhar em vez de não trabalhar. Ive calculou que o trabalho compensaria mais do que uma aposentadoria milionária na sua Inglaterra, o chinês anônimo calculou que o trabalho compensaria mais do que a lida no campo. O livre mercado, portanto, não é igualitarista, mas é uma forma livre de cooperação social. Por ele, nem todos obtêm as mesmas vantagens materiais, mas ninguém tem sua liberdade restrita, se entendermos por liberdade a capacidade de agir segundo seus próprios cálculos de custo e benefício, sem coerção externa.
Mas e o modelo de Obama, que é o modelo estatal de cooperação social? A trivialidade que Obama disse camufla uma verdade na qual, talvez, ele nem sequer tenha pensado. O que ele disse, inserido no devido contexto, significa mais do que afirmar simplesmente que, juntos, podemos fazer melhor. Ao defender que o Estado seja o mandante da ação conjunta, o que Obama defende implica que um indivíduo que julgue não ser beneficiado pela cooperação pode ser coagido pelos demais a cooperar.
Agora, por favor, compare os dois cenários. O operário chinês vive em condições materiais desfavoráveis. Porém, ele se perfilou na porta da FoxConn candidatando-se a um posto de trabalho. Por tudo que sabemos, ele não foi capturado na zona rural e levado à força para o perímetro urbano, para ser submetido a trabalho escravo. Até onde sabemos, inclusive, ele pode deixar o emprego se assim o desejar. Assim, a condição material do chinês pode estar em contradição com o ideal de vida do meu leitor, mas você não fará nenhum sentido se afirmar que o chinês não é livre. A menos, é claro, que estejamos falando de coisas diferentes quando usamos a palavra "liberdade". E quanto ao cenário estatal de cooperação social?
Muito bem, novamente, de acordo com o seu ideal de vida, pode ser indesejável que alguém não tenha acesso à saúde. Porém, você não pode dizer que não teve sua liberdade restrita aquele que foi forçado a contribuir para que o Estado pudesse facilitar o acesso de outros à saúde. Se uma mera pracinha é construída com dinheiro público, ela é construída com recursos obtidos via coerção, e não por doações espontâneas. Assim, você pode gostar mais do seu bairro com a pracinha, pode até mesmo afirmar que você não poderia ter construído a pracinha sozinho e nem teria como convencer seus vizinhos a construí-la com você. Mas você não pode dizer que ela seja fruto de livre cooperação, a menos que todos os contribuintes, sem exceção, tenham concordado ou, diretamente, com a construção da pracinha ou, indiretamente, com qualquer que fosse o uso daqueles recursos que envolviam sua contribuição.
Por exemplo, alguém pode fazer uma doação para uma associação de bairro e concordar que o recurso seja utilizado em uma melhoria qualquer para o bairro, conforme o resultado de uma votação. Nosso contribuinte, particularmente, preferiria uma rampa para prática de skate, mas sua liberdade foi respeitada com a construção da pracinha, uma vez que ele aceitou fazer a contribuição, bem como concordou com o procedimento de decisão sobre o destino de sua contribuição. Simplesmente, não é esse o modelo estatal.
No modelo estatal, o indivíduo é forçado a contribuir e a acatar o modelo de decisão, que, na melhor das hipóteses, lhe dará direito a um voto, que bem pode ser o voto vencido. É por essa razão que a cooperação social restringe, e não amplia a liberdade individual, quando é levada a cabo por meio do Estado, e não por via do mercado ou de associações privadas. A grande diferença entre o mercado ou associações privadas e o Estado é que, no mercado ou nessas associações, cada indivíduo precisa estar convencido de que tem mais a ganhar do que a perder ao tomar parte em qualquer iniciativa conjunta. Quando há interferência estatal, por outro lado, embora seja bem possível que o indivíduo ainda tenha muito mais a ganhar do que a perder com a cooperação, ele não precisa estar convencido disso. É esse o ponto que coloca o Estado em conflito com a liberdade individual sempre que ele se incumbe de tarefas construtivas como as que os democratas, por exemplo, têm em vista.
Neste ponto, você pode perguntar: "um mundo mais igual, do ponto de vista material, não seria preferível a um mundo livre?" Talvez, sua resposta seja "sim". Você pode ser do tipo que realmente sobrepõe a igualdade à liberdade, enquanto meu ponto com este post é, sobretudo, argumentar que Obama estava errado em sua colocação, isto é, mostrar que iniciativas estatais restringem, sim, a liberdade, portanto, ele deveria assumir que suas políticas violentam a liberdade individual. Isso signifca que, ainda que eu esteja certa, você poderia, perfeitamente, preferir um mundo em que o Estado tome decisões pelos indivíduos em nome do próprio bem de cada um. O único problema com essa decisão é que, via de regra, você só será coerente com ela, quando, acidentalmente, a imposição estatal coincidir com o que você quer ver realizado, ou, em outras palavras, quando forem os outros os efetivamente coagidos. Afinal, qual o sentido de alguém, espontaneamente, querer ser coagido a fazer o que não quer ou deixar de fazer o que quer? O que você quer é que os outros sejam coagidos a cooperar com seu ideal de mundo, de vida.
Imagine, por exemplo, que você queira melhorar a situação daquele operário chinês citado acima ou ajudar seu concidadão a ter acesso à saúde. O mercado não lhe proibe de fazer nada disso! Você pode transferir metade do seu salário para a conta de um operário na China, bem como pode deixar de beber cerveja para doar o dinheiro a um idoso pobre que precise de medicamentos. Ok, louvável da sua parte! Ser um estatista, como Obama, porém, é ir muito além disso. É querer que todos os demais sejam coagidos a entregar, por exemplo, o valor equivalente ao de uma cerveja para que o Estado possa comprar medicamentos para quem precisar. Bela compaixão, diria (e disse) Romney! No fim, é claro, o Estado acaba tirando o dinheiro do seu remédio para que algum político tome cerveja com ele. Mas isso já é outra história...
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